Distribuição de absorventes no Brasil: Políticas limitadas pelo estigma que querem combater

  • Por Lari Agostini
  • 8 de fevereiro, 2024

Nos últimos anos o debate acerca da dignidade menstrual tem se intensificado e graças ao trabalho de instituições, ativistas, sociedade civil e mulheres na política tem conquistado espaço dentro da agenda pública. O Brasil, após décadas de invisibilidade do tema, celebra avanços inéditos em legislações voltadas para políticas menstruais. Entretanto, é preciso observar com criticidade e cautela como essas transformações tem sido construídas.

De que políticas estamos falando? Onde elas estão acertando ou falhando? E o mais importante, elas realmente estão mudando a forma como pensamos a menstruação?

Observando o panorama legislativo atual percebe-se que as políticas concentram esforços no controle do sangramento e no fornecimento de absorventes descartáveis, o que de fato, faz sentido em um país que tem os maiores índices de pobreza menstrual do mundo. Ainda assim, há falhas na maioria dos projetos, pelo fato de serem construídos ainda sob a influência social do estigma.

Na última semana a notícia de que o programa Farmácia Popular distribuiria absorventes em todo Brasil foi recebida com entusiasmo. Mas apesar de ser motivo de comemoração, já que esse programa tinha sido vetado em 2021 pela anterior gestão, a implementação apresenta desafios consideráveis.

Para receber o benefício pessoas com idades entre 10 e 49 anos e que estejam inscritas no CADúnico, possuam renda familiar até R$ 218,00 por pessoa, sejam de escolas públicas ou vivam em situação de rua devem apresentar além do documento com foto uma autorização digital emitida pelo aplicativo Meu Sus.

O que limita em muito o acesso, em especial para população mais vulnerável que não possui documento ou celular. A recomendação é de que então elas se dirijam a uma unidade básica de saúde para solicitarem a autorização impressa, o que apresenta um desafio visto a sobrecarga que as unidades já enfrentam.

A própria burocratização do CADúnico exclui populações vulneráveis que precisariam do benefício, como egressas do sistema prisional e outras faixas salariais de baixa renda. Outra questão crítica é a falta de Farmácias Populares que apesar de ser um grande programa, ainda não contempla todos os munícipios do país.

As políticas menstruais para serem efetivas e sustentáveis a longo prazo precisam considerar uma compreensão mais abrangente, não só pelos meios de como fornecer produtos, mas também por seu impacto em desfazer estigmas e promover mudanças culturais significativas, começando pela própria construção das leis, que deve superar o receio de garantir direitos, abandonando “pedágios” e eufemismos como o termo que vem sido comunicado “naqueles dias”.

Resolver um problema tão complexo que foi por tanto tempo invisível exigirá tempo, mas devemos nesse momento definir claramente nossos objetivos.

Se queremos focar no acesso a produtos menstruais, o objetivo das políticas públicas deve ser a erradicação da pobreza.

Se queremos resolver os problemas, o objetivo dessas políticas deve ser então, fomentar a autonomia e a saúde menstrual e reprodutiva para todas as pessoas.

Lari Agostini

Internacionalista e educadora menstrual

@lariagostini_